Rede de Cantinas da Terra do Meio realiza oitava Semana do Extrativismo na RESEX Rio do Xingu
Mais de 100 representantes de 26 comunidades e terras indígenas se reuniram para definir governança da rede e negociar contratos com 13 empresas
Entre os dias 14 e 18 de julho, a comunidade Gabiroto, na Reserva Extrativista do Rio Xingu, no Pará, recebeu lideranças que compõe a Rede de Cantinas da Terra do Meio, para realizar a Oitava Semana do Extrativismo (SEMEX). A rede é uma articulação territorial que envolve indígenas, ribeirinhos, agricultores familiares e as instituições de apoio que trabalham diretamente com as comunidades e tem o objetivo de comercializar os produtos da floresta a preços mais justos e valorizados junto a empresas que mantêm relação comercial ou que iniciam uma parceria local.
Hoje essa rede é formada por 27 cantinas na Terra do Meio com 8 miniusinas de beneficiamento de multiprodutos, 44 unidades de armazenamento (paióis)e estocagem, 9 casas de borracha e 153 estradas de seringa abertas. São 19 produtos e cooprodutos extrativistas que compõem hoje nas cantinas e miniusinas: borracha, castanha do Pará, óleo de copaíba, farinha de babaçu, entre outros.
Luciana Lima, Especialista em conservação da TNC, lembra que “dentro dessa rede é a união de várias instituições parceiras que vem para apoiar e fortalecer o propósito de envolver os territórios e agregar valor cultural dentro da produção dos produtos que vêm da floresta”.
Resultados da Semex
Durante a oitava semana do extrativismo a rede deu passos importantes. Foi feito um balanço financeiro das cantinas, elaborado e validado regimento de gestão mais detalhada e transparente para as comunidade e acordado um plano de recuperação para a quitação de débitos, que será construído em breve. Foi aprovada também a criação do fundo Terra do Meio que tem como iniciativa captar recursos ou parceiros comerciais para investir nesta linha voltada à melhoria da gestão, valorização dos produtos, apoio aos custos de funcionamento da rede, além do pagamento por serviços ambientais, os quais não estão inseridos no valor do produto até o presente momento.
Além disso, foi criada a Associação da Rede Terra do Meio, representante legal da rede de cantinas que comercializa os produtos da marca Vem do Xingu (@vemdoxingu). E foi eleita a primeira diretoria da associação, para mandato de 2022 a 2025:
· Presidente: Juma Xipaya
· Vice-Presidente: Assis Porto
· Secretário: Herlan Barbosa Silva
· Vice-Secretário: Pedro Pereira de Castro
· Tesoureira: Wane da Silva Gonçalves (comunidade Maribel)
· Vice-Tesoureira: Rayna Costa Nascimento
· Conselho Fiscal: José Santiago da Silva, lori Parakanā e Warawara Xipaya dos Santos
· Conselheiras eleitas ficais suplentes: Ngrenhararati Xikrin e Marines Lopes de Sousa
Para Francisco Porto, presidente da Associação Amoreri e líder da Rede de Cantinas, “é muito importante ver na composição da diretoria dessa rede uma quantidade de jovens e de mulheres envolvidas cada vez mais com esse trabalho que tem sido muito importante na conservação da floresta e na manutenção dos serviços ambientais. A criação da associação é mais um passo rumo ao seu fortalecimento”.
Crescimento da rede
A rede de cantinas passou de 8,5 mil reais negociados em 2009 para mais de 1,6 milhão em 2018. Atualmente, 12 empresas possuem contratos ativos/vigentes com a rede, que já beneficiou mais de 500 famílias das comunidades das Resex Rio Xingu, Riozinho do Anfrísio, Rio Iriri e Uruará e das terras indígenas Trincheira Bacajá, Apyterewa, Kuruaya, Xipaya e Paquiçamba.
Um dos principais avanços nos últimos anos foi a expansão da a participação de indígenas na Rede , como os povos Xikrin e Parakanã, parceiros da TNC Brasil na região desde a construção do Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA), e outros povos que recentemente ingressaram na rede, como o Povo Kararaô e Arara
Para Wenatoa Parakanã, coordenadora das gestoras indígenas na Terra Indígena (TI) Apyterewa, a rede é mais uma forma de ajudar a proteger os nossos territórios. “Para onde as nossas crianças vão se a floresta for toda derrubada? O que a gente tem é nosso e a gente tem que proteger, cuidar e não deixar os invasores entrarem”, afirma a Wenatoa.
Para Kwazady Xipaya, cacique, cantineiro e presidente da associação indígena Pyjahyry Xipaya, da Aldeia Tukamã, afirma que “em todos os projetos que a gente desenvolve dentro da aldeia o objetivo é sempre fortalecer a sustentabilidade alimentar, para nunca esquecer nossas origens e de onde a gente veio, e manifestar isso através dos nossos plantios, dos conhecimentos tradicionais, das ervas e da tradição”.
Negociação com empresas
Os dias 17 e 18 foram dedicados ao encontro entre as lideranças e empresas parceiras ou interessadas em conhecer de perto a realidade da rede e do manejo nos territórios e o formato de estrutura operado pelos gestores e produtores . Participaram executivos das empresas Mercur, Save the Forest, Natura, Bossa Pack, Wickbold e Amazonika Mundi para iniciar novos contratos ou alinhar condições dos atuais e renegociar preços. Embora não estivessem presentes no encontro, outras empresas como Mazo Maná, Nativeg, Citróleo, Decó Brasil, TUCUM, ATINA e Dengo enviaram compromissos que foram anunciados durante a reunião.
A Mercur, parceria mais antiga da rede, se comprometeu a aumentar em 30% o valor do quilo da borracha. A Bossa Pack irá reajustar em 30% o valor pago nos tecidos pintados.
“A grande contribuição que a empresa pode à rede é abrir o mercado para um produto que é feito aqui”, destacou Cláudio do Amaral Martins, sócio fundador da Bossa Pack.
Novas portas foram abertas para a farinha de babaçu, que testada pela Amazonika Mundi para receitas em produtos vegetarianos e pela Decó Brasil para comercialização da massa pronta de bolo de babaçu.
Principal compradora de castanha da rede, a Wickbold afirmou que irá antecipar informações fundamentais para o planejamento das comunidades, como informações referentes ao volume e preço da próxima safra.
“A gente quer contribuir não só com da compra dos insumos, mas também para manter a floresta em pé, que é um dos grandes trabalhos feitos pelas comunidades tradicionais, ribeirinhas, eles são os grandes guardiões dessa floresta. Nós levamos esse produto ao mercado e damos a chance aos consumidores de terem a escolha de um consumo mais sustentável, valorizando a cultura dessas comunidades tradicionais”, disse Juliana Santana, gerente de Desenvolvimento Humano e Head de Sustentabilidade da Wickbold.
Para José Santiago da Silva, agroextrativistas e conselheiro fiscal da Associação Agroextrativista Sementes da Floresta (Aasflor), a rede trouxe mais tranquilidade na relação entre agroextrativistas e empresas. “Quando conversamos com uma empresa, ela quer volume e quantidade e a gente não conseguia produzir em grande escala para fechar contrato com grandes empresas. Depois que criamos a rede facilitou esse lado de comercialização. Podemos juntar várias cantinas e fornecer para uma empresa”, conclui Santiago.