Aumento dos preços dos alimentos provocado por causas ambientais e climáticas preocupa os brasileiros
Exposição ao risco dos extremos climáticos impactam de formas desigual as comunidades em situação de vulnerabilidade social
Por Samuel Barrêto
A crise climática entrou na pauta das discussões familiares e redes sociais. Entre os principais problemas globais, os brasileiros estão cada vez mais preocupados com os impactos provocados pelos extremos climáticos relacionados à água, como secas e enchentes. Enquanto em uma ponta a expectativa é de que o Pantanal enfrente o ano mais seco de toda a sua história – segundo o monitoramento hidrológico divulgado pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB)* –, do outro lado, o governo do Rio Grande do Sul decretou estado de calamidade pública depois que 425 de 497 cidades gaúchas – o equivalente a 85,5% do estado – foram afetadas pela chuva que castiga a região desde o dia 29 de abril, de acordo com dados divulgados pela Defesa Civil.
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O levantamento “A percepção dos brasileiros sobre segurança hídrica", realizado pela The Nature Conservacy (TNC) Brasil com apoio técnico do Instituto Ipsos, mostrou que, dentre os problemas ambientais mais recorrentes, como as queimadas, o desmatamento e a poluição do ar, 83% dos brasileiros declaram que são as secas e as enchentes que mais os preocupam.
Contrariando percepções passadas, a pesquisa mostrou que os brasileiros têm cada vez mais clareza sobre os impactos ambientais e econômicos resultantes dos extremos climáticos. As pessoas em situação de vulnerabilidade social são as mais expostas as mudanças climáticas e suas consequências – à exemplo dos moradores da capital Porto Alegre, que enfrentam a maior enchente da história da cidade com o rio Guaíba.
Outro desdobramento resultante dos impactos provocados pelas mudanças climáticas na percepção da população foi relacionado ao preço dos alimentos, afinal tem sido nas feiras de rua e nos supermercados que os brasileiros mais sentiram os impactos gerados pela crise do clima. O aumento no preço dos alimentos é uma preocupação constante para 65% da população. Considerando tais desafios, um dado importante revelado pela pesquisa mostrou ainda que 63% dos brasileiros acreditam que é possível combinar desenvolvimento econômico com proteção ambiental, enquanto 83% afirmaram perceber essa correlação de causa e consequência.
Apesar dos avanços nesta tomada de consciência, a disparidade no entendimento e no engajamento ambiental entre as diferentes classes sociais e níveis de escolaridade evidenciam a necessidade de um processo da educação para que as soluções sejam mais inclusivas, duradouras e abrangentes. Pessoas com menor escolaridade – com ensino fundamental completo ou incompleto – atribuem a falta de água à escassez de chuvas e, em geral, atribuem o cuidado com a água a uma atitude individual, enquanto os entrevistados com maior escolaridade – com ensino superior ou pós-graduação – acreditam que a falta de gestão pública é o principal responsável para endereçar o problema.
Embora as ações individuais sejam muito importantes, iniciativas como essas devem ser complementares aos esforços coletivos, envolvendo governos, iniciativa privada e a sociedade civil, uma vez que têm a capacidade de transformar os sistemas atuais. Juntos, esses setores podem ampliar as ações estruturantes, como as realizadas pelos Comitês de Bacias Hidrográficas, no combate às crises de clima e de escassez hídrica.
É nesse contexto que surge a necessidade de criar canais efetivos de comunicação e engajamento com toda a população, agregando diversidade social e econômica para combinar as ações individuais do cidadão com os esforços coletivos. Enquanto a maioria (75%) afirma que adota o não desperdício como uma estratégia de proteção da água, apenas 12% participam de iniciativas coletivas. São as medidas coletivas e adaptadas às mudanças climáticas, com foco na gestão e governança dos recursos hídricos, que farão a diferença na construção de um futuro possível para todos nós. Ter clareza sobre os problemas ambientais é importante, mas sem ação a mudança não acontecerá.
Então o que fazer com todas estas informações? Uma resposta que essa pesquisa revela é a necessidade de os governos, empresas e sociedade se prepararem desde já para as situações adversas causadas pelos extremos climáticos, começando pelo desenvolvimento de ações preventivas fundamentais de adaptação e resiliência climática, se afastando de ações imediatistas. Hoje, o elemento surpresa não existe mais. Já é um fato que os eventos climáticos extremos vão continuar acontecendo com mais intensidade e frequência. Não podemos esquecer que 2024 é um ano de eleições municipais para vereadores e prefeitos dos 5.568 municípios brasileiros. Uma excelente oportunidade para avaliar se os candidatos apresentam propostas com políticas concretas para lidar com os extremos climáticos, usando de soluções baseadas na natureza.
Publicado originalmente em Um Só Planeta
16 de abril de 2024
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